O sorriso de Lilí / Homenaxe a Araceli Herrero Figueroa / Colectivo Egeria
Mestra da escola livremente assumida
À hora de ensinar e aprender, o melhor dos vínculos que podem existir entre docente e discente é o livremente assumido polas partes implicadas, sem vínculos administrativos a marcarem obrigas de níveis e de tempos.
Fum beneficiário do ensino altruísta e a distância que me ofereceu Martinho M. Santalha, quando eu estudava COU no Instituto de Ortigueira e ainda desconhecia que no ano seguinte mestre e discípulo coincidiríamos em Compostela no que seria o Seminário de Estudos Galegos dos nossos tempos: a Associaçom Galega da Língua (AGAL).
Através de Manuel Portas e de Luís Gonçález Blasco (“Foz”), desde o outono de 1982 assistim aos primeiros eventos formativos organizados pola AGAL e conhecim o professor Ricardo Carvalho Calero e a sua equipa mais próxima, formada por professorado universitário e por ex-alunos e alunas que estreavam docência no ensino secundário. Nesse ambiente de universidade galega de livre adopçom tivem notícia de Araceli Herrero Figueroa. Falava-nos dela o nosso professor José Luís Rodríguez -o sábio de Vila Maior de Negral- e o mesmo faziam Maria do Carmo Henríquez Salido e Aurora Marco, quem consideramos Mestras fundamentais, ainda sem nunca estarmos matriculados nas suas matérias oficiais. Neste contexto, sem a ter visto, passei a identificar Araceli com duas etiquetas: discípula de don Ricardo Carvalho -primeiro no Colégio Fingoi e depois na Faculdade de Filologia- e professora da Escola de Magistério.
O perfil docente e investigador de Araceli conhecim-no um ano mais tarde. Foi em setembro de 1984 na cidade de Ourense pouco antes da sua palestra no I Congresso Internacional da Língua Galego-Portuguesa na Galiza, onde nos apresentou um tema de crítica literária da obra de Rosalia de Castro, à luz dumha certa polémica entre Ricardo Carvalho Calero e María Xosé Queizán a respeito do tratamento da questom de género na “História da Literatura Galega”. Seis anos mais tarde (em 1990), no III Congresso celebrado no mesmo lugar, o professor Carvalho -que falecera uns meses antes- recebeu a primeira grande homenagem post-mortem: foi-lhe dedicado o encontro científico e, dentro dele, reservou-se umha parte monográfica de estudo da sua obra. O contributo de Araceli Herrero foi “O estatuto do narrador. Pluridiscursividade e intertextualidade em Aos amores seródios”. Noutras palavras: um estudo de literatura comparada entre o teatro de Castelao (“Os velhos...”) e um relato curto de Carvalho (“Aos amores seródios”). Foi umha exposiçom brilhante feita sobre um texto que conserva total vigência nos nossos dias.
Nesse mesmo ano de 1990 teria eu a oportunidade de ser privilegiado discípulo de Araceli. Foi através de Ramón Reimunde Norenha, de quem nasceu a iniciativa de dedicar um congresso a Álvaro Cunqueiro em Mondonhedo, com motivo de lhe ser dedicado o Dia das Letras Galegas no décimo aniversário da morte.
Araceli acompanhou-nos com entusiasmo e dela recebim a primeira grande liçom na reuniom inicial, destinada a elaborar umha proposta de programa. Xavier Cordal -naquela altura professor no Instituto San Rosendo- e eu tivemos a magnífica demostraçom de como se organizava um evento daquelas características e aproveitamos a ocasiom para aprender e para colaborar na medida das nossas possibilidades. A mestra Araceli e o mestre Ramón marcarom as grandes linhas temáticas que se iriam abordar: o perfil biográfico, a narrativa, a poesia, o teatro e o jornalismo de Cunqueiro; e depois apresentarom propostas de convites a possíveis relatores, sempre com duas ou três propostas alternativas, e debaterom os prós e contras. Para nós era interessantíssimo conhecer a pluralidade de nomes e de currículos e os resultados que poderiam dar. Como complemento para as palestras, Reimunde ocupou-se de preparar umha visita à Terra de Miranda, de convencer a D. Jaume Cabot -através de Rubén Leivas- para que nos oferecesse um concerto na Catedral e negociou num lado e noutro a colocaçom na Fonte Velha dumha placa de pedra trabalhada no obradoiro do descendente do Licho de Vilamor; e Xavier Cordal foi o artífice de que o Colectivo Literário Ronseltz nos oferecesse um magnífico recital em Mondonhedo.
Se a primeira foi de organizaçom, a segunda liçom centrou-se no relacionamento diplomático. Quando o quarteto organizador apresentou a ideia à alcaidesa de Mondonhedo, Enma Valcarce Pestaña, Araceli foi a nossa porta-voz e realizou um trabalho excepcional num ambiente em que se nos recebia à defensiva. Ficou-nos claro que deveríamos bater em mais portas, mas reafirmamo-nos na ideia de conseguir organizar o congresso.
Bernardo Penabade, Xabier Cordal, Araceli Herrero e Ramón Reimunde, coordinadores do Congreso Cunqueiro (Mondoñedo, 1991)
A terceira liçom magistral foi a do saber estar durante a celebraçom evento. Desde o primeiro momento, Araceli e Moncho estiverom recebendo as pessoas inscritas e recebendo e acompanhando as convidadas. Os novos tivemos sempre a segurança do que devíamos fazer e de como deveríamos fazê-lo, sempre com o estímulo do exemplo. Na medida em que iam avançando as três jornadas, percebíamos a grandeza humana de Araceli Herrero. Para além dos formulismos, nos momentos em que finalizava cada ciclo temático e cada dia, a nossa companheira mostrava-se umha pessoa alegre por como estava saindo todo. Satisfeita da qualidade dos diferentes relatórios, antes da clausura pensou na hipótese de afrontar a publicaçom das actas. Lembro perfeitamente as suas palavras em presença de Enrique Fernández, vice-presidente da Deputaçom de Lugo, que se comprometeu a colaborar.
Por ordem cronológica, a quarta liçom da minha bemfeitora recebim-na durante o processo de ediçom do livro “Congresso A. Cunqueiro” (1993). Entre Araceli e Ramón conseguirom os textos redigidos polos relatores e relatoras e outros elaboramo-los nós partindo das gravaçons. Umha vez seleccionados os conteúdos para a ilustraçom, chegou o momento de fixar os textos definitivos, de supervisar a diagramaçom e de corrigir as provas de imprensa, umhas tarefas em que de novo se implicou Araceli. Dela aprendim a base do que sei hoje em matéria de ediçom, uns conhecimentos que mais tarde aproveitei para mim e para várias pessoas a quem ajudei e ajudo por amizade ou como colaboraçom académica.
Inicialmente, durante os primeiros anos de conhecimento unilateral, comecei vendo Araceli Herrero Figueroa como a especialista na obra de Luís Pimentel (Celta; 1981); a editora do teatro histórico e marinheiro de Armando Cotarelo Valledor (Do Castro; 1984); a estudosa do teatro representado em Fingoi e do escrito por Xesús Rodríguez López (1988); a autora de “Sobre Luís Pimentel, Álvaro Cunqueiro e Carballo Calero” (Do Castro; 1994), talvez a obra que a deixou mais satisfeita; e como umha professora que sempre colaborava nas iniciativas do estudantado. Mais tarde tivem a fortuna de a tratar humanamente e de beneficiar-me da sua escola, algo que agora quero agradecer publicamente.